
Aluno da Escola Estadual Walt Disney, em Belo Horizonte: rede mineira vai aproveitar mais tempo de Português para ofertar aulas de leitura e de escrita — Foto: Dirceu Aurélio/Imprensa MG
As mudanças do Novo Ensino Médio aprovadas em 2024 já começam a ser implementadas por pelo menos 16 redes estaduais. As alterações são obrigatórias apenas em 2026, mas essas secretarias decidiram fazer currículos de transição ou pelo menos reformular as grades. Em todos os casos, as disciplinas tradicionais já estão tendo suas cargas horárias aumentadas — uma correção, na avaliação dos especialistas, que precisava ser feita do antigo modelo.
Além disso, cada uma das redes construiu diferentes formatos de como isso será organizado e o que fazer com esse tempo. Em Minas Gerais, por exemplo, haverá uma aula semanal focada em leitura e escrita. Já o Rio tomou a controversa decisão de deixar o aluno escolher trocar um reforço em Português e Matemática por ensino religioso.
O Novo Ensino Médio foi aprovado em 2017 e implementado a partir de 2021. No entanto, o baixo tempo de disciplinas tradicionais substituídas por uma proliferação de disciplinas sem consistência pedagógica — que, no limite, chegavam até a aulas de bolo de pote ou brigadeiro gourmet — resultaram em uma intensa pressão por mudanças.
Em 2024, o Congresso aprovou a reforma do modelo elevando a formação geral básica (grupo das disciplinas tradicionais cujo currículo é igual para todos os alunos) de no máximo 1,8 mil horas para no mínimo 2,4 mil. Já os itinerários formativos (as aulas que os alunos podem escolher) caíram de 1,2 mil horas para 600.
Com essas mudanças, quase todas as disciplinas cobradas no Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) voltam a ser ministradas no 3º ano de redes públicas que privilegiavam outros conteúdos nesta etapa escolar, como o Rio de Janeiro e o Acre. Alunos que fizeram a prova em 2024 não tiveram, no ano do vestibular, aulas como Química, Física, Biologia, História e Geografia — mas os de 2025 terão.
Aulas de religião no Rio
No entanto, algumas decisões polêmicas também foram apresentadas pelo governo do Rio. A secretaria definiu que em “Eletiva 1” o aluno vai poder trocar um reforço escolar “preferencialmente em Português ou Matemática”, como diz a resolução do governo estadual, por ensino religioso.
Trata-se de um componente de 40 horas anuais que será oferecido nos três anos do ensino médio. A rede fluminense é penúltima colocada no Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb), anunciado no ano passado, de 2023.
Em nota, a secretaria afirmou que “de acordo com a legislação vigente, o Ensino Religioso e o reforço escolar são eletivos (...) e, portanto, opcionais” e que o aluno pode optar por aulas de reforço escolar em disciplinas em que tenha menor rendimento, com prioridade para disciplinas de Matemática e Língua Portuguesa.
Outras redes estão buscando soluções mais convencionais para essa oportunidade de reformulação. Em Minas Gerais, o aumento da carga horária de Língua Portuguesa vai abrir espaço no currículo para uma aula semanal dedicada obrigatoriamente à “consolidação de competências de leitura e escrita”. Nos dois primeiros anos, o foco será leitura, e no 3º ano em produção textual.
Já o Maranhão criou para 2025 dois novos componentes curriculares. Um chamado Identidade e Protagonismo e o outro Cidadania Digital, “iniciando o processo de implementação da lei que estabelece a Política de Nacional de Educação Digital”, diz a rede.
‘Não é um vale-tudo’
Depois da aprovação das novidades pelo Congresso, o Conselho Nacional de Educação (CNE) aprovou diretrizes para que os estados pudessem organizar suas redes com base nas novas regras. Ele definiu que as redes deverão começar o ano letivo de 2026 com todas as alterações para os novos alunos. Elas estão autorizadas, porém, a criar uma matriz curricular de “transição” já em 2025, como está acontecendo.
Ainda conforme orientou o CNE, os estados têm liberdade para decidir o que acontecerá com os alunos que começaram o ensino médio no antigo modelo. É o caso de quem cursará, em 2025, o 2º e o 3º ano do ensino médio.
Estados como o Rio Grande do Sul, Amazonas e Roraima, por exemplo, decidiram retirar todos os componentes dos itinerários formativos do currículo do 3º ano em 2025 para que esses alunos tenham uma carga horária de 2,4 mil horas de disciplinas tradicionais — o conjunto de aulas também chamado de formação geral básica — contando os três anos do ensino médio. Já o Piauí decidiu fazer o aumento da carga horária das disciplinas tradicionais apenas para os alunos do 1º e 2º ano em 2025. Quem está no 3º ano vai manter a grade curricular prevista.
Para o ano que vem, as redes ainda vão precisar fazer novas adequações — para então construir suas grades curriculares definitivas. O CNE e o Ministério da Educação ainda precisam construir diretrizes nacionais para a criação de itinerários formativos, a parte em que o aluno escolhe o que estudar. Essa é uma das estratégias para que esses componentes curriculares mantenham a relevância pedagógica. A expectativa é que esse processo termine por volta de março.
— Os itinerários precisam ser flexíveis, mas não é um vale-tudo. Essas diretrizes que estão em discussão vão impedir interpretações desvinculadas da intencionalidade escolar. Ela consegue amarrar melhor o que pode ser ensinado nesse tempo, sem aprisionar demais — afirma Israel Batista, relator das diretrizes aprovadas pelo CNE.