O que deveria ser uma infância de educação, brincadeiras, respeito e dignidade se tornou em uma vida de adulto precoce recheada de obrigações profissionais. É desta forma em que cerca de 30.832 crianças, com faixas etárias entre 5 e 17 anos, vivem no estado de Alagoas em situação de trabalho infantil.
Os dados são da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad), realizada no ano de 2014, onde mostra também em que cerca de 50.8% destas crianças atuam em trabalhos relacionados a agricultura, pecuária e pesca.
Além da agricultura, com 38,3%, o setor com mais crianças e adolescentes ocupados é o de comércio e reparação, com 24,7%, segundo a Pnad realizada pelo Fórum Nacional de Prevenção e Erradicação do Trabalho Infantil (FNPETI). O percentual do Nordeste no setor se aproxima dos patamares encontrados no Sudeste.
Apesar dos números, o estado de Alagoas registrou uma redução de cerca de 35% nas formas de trabalho infantil. Entre os anos de 2014 e 2015, o estado foi classificado como o terceiro estado do país na redução do trabalho das formas mais perigosas, perdendo, no Nordeste, apenas para o estado do Ceará.
Mesmo apresentando uma redução positiva nos índices, a assistente social da Secretaria de Estado da Assistência e Desenvolvimento Social (Seades), Marluce Pereira, afirma que se for levando em consideração a conjuntura atual em que vive o país há um risco de uma possível tendência ao crescimento destes números nos próximos anos.
“Levando em consideração o congelamento de recursos proposto pelo governo federal em áreas estratégicas e que também existem mais de 13 milhões de desempregados no país, isso acaba levando algumas famílias a se utilizar do trabalho infantil, como uma estratégia de sobrevivência”, disse Marluce Pereira.
Ainda para a assistente social, Marluce, uma das alternativas para sanar este dilema é a conscientização. "Precisamos mostrar para sociedade o quão danoso é legitimar o trabalho infantil, mas unido a isto são necessárias também ações de fiscalização, porém com o desmonte do Ministério do Trabalho, estamos comprometendo essa atuação e dificultando mais ainda o nosso trabalho”.
As inúmeras consequências do trabalho infantil na vida de crianças e adolescentes tem prejudicado a aprendizagem e as tornado ainda mais vulneráveis em diversos aspectos como a saúde, exposição à violência, assédio sexual, esforços físicos intensos e acidentes com máquinas. Para o psicólogo clínico, João Porto, a criança é um indivíduo que está em desenvolvimento e que ainda é muito vulnerável.
“Existem dois quesitos psicológicos que precisam ser considerados nesta situação, o primeiro é que muitas destas crianças não frequentam a escola, então com isso acabam não tendo um estímulo cognitivo nem um desenvolvimento social adequado e o segundo é que há uma vulnerabilidade social nestes locais e pode acarretar em algumas situações de riscos para a criança como aliciamento sexual, violência física, consumo de drogas, dentre outras questões”, destacou João Porto.
Cerca de vinte artigos da Lei 8.069/1990 fazem referência ao trabalho infantil e à profissionalização de adolescentes em idade permitida, entretanto para o Juiz Titular da 10º Vara do Trabalho de Maceió, Alonso Cavalcante, mesmo com a existência de uma legislação a situação persiste.
Parte da lei menciona sobre a proibição de qualquer forma de trabalho até os 13 anos, mas garante na condição de aprendiz, a partir dos 14 anos até os 24, no entanto há restrições ao trabalho noturno, insalubre e inadequado. Os artigos apontam também as punições previstas para empresas e pessoas físicas que violam os direitos assegurados pelo Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA).
Ainda sob a análise do Juiz da Vara do Trabalho, Alonso Cavalcante, o trabalho infantil é consequência de uma desestruturação social, e ressalta que apesar da penalidade ser bastante variável, o judiciário em conjunto com outros órgãos e com a sociedade tem cumprido sua parte. “Toda vez que você viola uma lei, existe penalidade. Para quem descumpre o ECA a pena é muito volátil, vai depender muito do caso e do entendimento do magistrado que estará com o caso, mas há situações que podem levar somente a uma simples autuação e outros que podem levar até à prisão”, afirmou o magistrado.
Já para o conselheiro tutelar Fábio Rogério, que atua na parte baixa da capital, o trabalho infantil é um grande problema social que não será resolvido apenas “apagando incêndios”.
“Infelizmente os resultados positivos são poucos, pois enfrentamos uma falha no sistema. Se tivéssemos uma escola em tempo integral de qualidade que atraísse o adolescente, mais ofertas no programa Jovem Aprendiz e outras oportunidades, essa realidade poderia ser diferente”, concluiu Fábio Rogério.
Fonte: Cada Minuto