Leo Lins no espetáculo “Enterrado vivo”: “A mensagem da Justiça é: ‘Se você é preconceituoso, não faça piada, mate!’ Vai sair mais cedo da cadeia” — Foto: Divulgação
Em seu primeiro show na capital paulista - depois de ser condenado a oito anos e três meses de prisão- por propagar discursos considerados discriminatórios, o humorista Léo Lins, de 42 anos, lotou o Teatro Gazeta, com capacidade para 720 pessoas (ou cúmplices, como chama quem ri de seus impropérios). Spoiler: no espetáculo “Enterrado vivo”, Leo Lins está mais ácido do que nunca e usa a sentença como marketing.
Ele dedica boa parte dos mais de 70 minutos de show a esculachar o que ele e seu público chamam de “politicamente correto”, zombar do Judiciário e debochar das mesmas minorias que o colocaram no banco dos réus.
Gabarita o amplo leque de piadas inadequadas, ao atacar negros, deficientes, obesos e soropositivos, além de caçoar da pedofilia e do nazismo. Firme na persona do perseguido, elenca os variados processos judiciais aos quais responde, fica confortável para repetir algumas das suas piadas mais criticadas e flerta com a impunidade. “Se você cometeu um homicídio sendo réu primário, consegue chegar a pegar sabe quantos anos? Seis anos. Eu peguei oito. A mensagem da Justiça é: ‘Se você é preconceituoso, não faça piada, mate!’ Vai sair mais cedo da cadeia.”
O humorista encontrou na própria controvérsia o combustível de sua mais recente turnê. Capitalizou o status de “proibido” que a Justiça lhe atribuiu e usou isso para alavancar a fama. A própria sinopse do espetáculo usa a querela judicial como propaganda: “Em 2024, seu show foi proibido em mais de 50 cidades, teve suas redes sociais canceladas, enfrentou ameaças de prisão e está sendo processado pelo Ministério Público, tudo por conta de seu conteúdo provocador que desafia o politicamente correto”, diz o anúncio.
Parece ter surtido efeito. A expectativa de uma possível prisão provocou uma espécie de corrida até o teatro de fãs que antes o conheciam somente pelas redes sociais.
A pedido de seus advogados, Leo Lins começa o show com um aviso à plateia. Os espectadores devem guardar seus celulares em pequenos sacos pretos recebidos na entrada, e lacrar o invólucro. Quem não colabora é retirado do recinto. A partir daquele momento, ninguém pode filmar ou fotografar. O que será dito na próxima hora deverá ser mantido ali, em segredo. O apelo é um prenúncio do tom depreciativo que permeia todo o show. O pacto com o público quer, em última instância, evitar que sua situação se agrave ainda mais. “Vocês não querem que eu acabe realmente indo preso, tá bom?”, ele inicia.
Em sua defesa, tanto no espetáculo quanto em suas redes sociais, Leo Lins argumenta que tudo não passa de encenação. Quem fala no palco, diz, não é ele, mas o personagem.
Leo Lins foi condenado por propagar piadas que “fomentam a violência verbal e a intolerância” em show de humor gravado em 2022, em Curitiba, e divulgado nas redes sociais. A sentença, da 3ª Vara Criminal Federal de São Paulo, também impõe ao comediante o pagamento de multa e indenização por danos morais coletivos. Sua defesa está recorrendo.
Segundo a Justiça, o vídeo intitulado “Perturbador” contém declarações preconceituosas contra negros, obesos, idosos, pessoas com HIV, indígenas, homossexuais, judeus, nordestinos, evangélicos e pessoas com deficiência. A gravação chegou a três milhões de visualizações e foi suspensa do YouTube em agosto de 2023.
Em seu show atual, Leo Lins mostra que polêmica e transgressão podem vender até mais ingressos do que humor. “A intenção de toda piada é fazer rir. Por isso, procuro não me importar que algumas figuras da Justiça me enxerguem como um criminoso. Prefiro enxergá-los como divulgadores do meu trabalho. Quanto mais tentam me calar, mais ouvido eu sou. Até surdo já me escuta”, finaliza.