"No caso do Brasil, que era um importante fornecedor de alimentos, por alguns problemas nos pagamentos de Cuba, esse crédito não foi ampliado e agora as compras precisam ser em espécie", diz ele.
Alguns economistas também sinalizam que a crise na Venezuela, principal parceiro comercial e aliado político da ilha desde a gestão de Hugo Chávez, também é responsável pelo cenário de desolação nas lojas de Havana.
Qual o impacto das sanções dos EUA?
Depois de uma breve aproximação que levou à reabertura de embaixadas nos dois países, houve um revés nas relações entre Cuba e Estados Unidos com a chegada ao poder do presidente Trump.
A Casa Branca, que mantém um embargo à ilha desde a década de 1960, anunciou nos últimos meses novas sanções que incluem restrições de viagem para cidadãos americanos e a ativação da terceira parte da Lei Helms-Burton (que permite a quem perdeu suas propriedades após a revolução processar o governo).
Havana considera essas sanções e o embargo como os principais motivos para a atual crise de desabastecimento.
"As sanções e as medidas de Trump não têm uma influência direta sobre essa escassez. Mas é certo que isso deixa os bancos estrangeiros mais relutantes em querer negociar com Cuba, e buscar outros bancos encarece o processo de comércio em geral e as importações", avalia Torres.
"Mas o desabastecimento começou antes mesmo de Trump anunciar essas medidas", acrescenta.
Por uma cláusula especial do Congresso dos EUA, Cuba pode comprar alimentos do país, algo que não foi alterado por Trump.
De acordo com dados da organização independente de agricultores American Farm Bureau Federation, dos US$ 2 bilhões que a ilha gasta em produtos agrícolas por ano, cerca de US$ 150 milhões são destinados a compras no país vizinho.
O 'período especial' pode voltar?
Os cubanos consultados pela BBC News Mundo dizem que a maior preocupação da população é que o desabastecimento se torne crônico, e a ilha retorne ao chamado "Período Especial", que segundo eles, significa passar fome como em tempos de guerra.
Cuba entrou em crise nos anos 1990, quando a queda da União Soviética deixou a ilha sozinha no cenário internacional, perdendo toda a ajuda que recebia do bloco.
A partir de então, alimento, transporte, vestuário e eletricidade se tornaram artigos de luxo, até que Havana encontrou em Caracas um novo aliado.
O governo cubano nega que a ilha esteja à beira de um novo "período especial" e garante que o desabastecimento será temporário.
"Não é uma questão de voltar à fase aguda do Período Especial... Mas temos que estar preparados para a pior variante, precisamos estar alertas e conscientes de que estamos enfrentando problemas adicionais e que a situação poderia piorar no futuro, em alguns meses", anunciou em abril o ex-presidente Raúl Castro.
Muitos economistas concordam que a atual crise de desabastecimento não tem solução no curto prazo.
Enquanto isso, muitos cubanos se perguntam qual produto estará em falta amanhã ou até onde será que as filas vão chegar.
"Você vê as pessoas na frente das lojas, esperando os estabelecimentos abrirem. Ontem a fila dava a volta no quarteirão. As coisas mais básicas voltaram a ser um luxo. Basta imaginar que as pessoas ficam felizes quando conseguem comprar um pedaço de frango", diz Blanco Rodríguez.